Um conto da Cebola



Mais ou menos uma vez por mês, vou a São Paulo, passar uns dias com o Fred, como ele mora sozinho nunca tem nada alem de bebidas na geladeira, esta é uma peculiaridade de muitas pessoas quem vivem nos grandes centros, sem falar que há uma grande parcela de Paulistas, que tendem adorar restaurantes. Assim para tira-lo desta rotina, vez por outra vamos ao mercado, alias  é “O mercado”, trata-se de um super gaúcho  que em São Paulo é demais de bom, talvez seja o único  que gosto de ir, não sei se é por que tudo parece ter muita qualidade, ou porque o lugar é um charme, ou simplesmente porque nunca sou eu quem paga a conta,de certo que a companhia do Fred e a soma de todas estas coisas, definem essa minha preferência. Assim algumas vezes compramos suprimentos, na medida exata  para a estadia,com isso sempre acabo preparando algo delicioso para curtimos o aconchego do cantinho do Fred.
Eis que, umas das vezes que fui, entre outras coisas, compramos duas cebolas, uma eu usei no molho da macarronada e a outra acabou sobrando, foi quando a guardei cuidadosamente na gaveta de legumes da geladeira, sabe aquela gaveta que fica bem em baixo? Pois é, foi exatamente lá que ela ficou. Passado um mês eu retornei, cheguei tarde, quando entrei em casa perguntei ao Fred se tinha algo pra beber , ele disse: “Vai La na geladeira da uma olhada, tem uma surpresinha pra você”. Um pouco desconfiada e divertida fui imaginando que encontraria uma daquelas cervejas vermelhas e deliciosas que o Fred sempre tem guardadinha para ocasiões especiais. Quando abri a porta da geladeira não pude acreditar no que vi, simplesmente fiquei boquiaberta, nada tinha dentro a não ser uma linda e genuína expressão de vida. Saia da gaveta térrea de legumes, um talinho de um verde cintilante e translucido, subia no cantinho direito do fundo da geladeira, bem coladinho até a lâmpada que fica no alto e lá, bem próximo da lâmpada o talinho ficava mais fino, e com uma pontinha mais fininha ainda, certamente em busca de calor, tocava delicadamente a base de metal da tomadinha onde acopla a lâmpada. 
Muito surpresa, depois de alguns instantes de contemplação, abri um pouquinho à gaveta dos legumes, queria ver de onde tinha surgido aquela vida, e para meu absoluto espanto vi que saíra daquela cebola que eu havia deixando antes de partir, a mais de um mês, a pobrezinha estava magrinha quase sequinha, no entanto seu talo era o mais lindo talo de cebola que já vira , foi então que o Fred me falou de forma solene “o destino dela está em suas mãos eu é que  não vou tirar ela daí ”. Que decisão difícil. O que fazer? O que você faria?



Alba Regina Bonotto

Comentários

  1. vida de cebola não é facil.. e ai vegetarianos insensiveis... o que dizer? vai matar a pobrezinha?

    ass/: Natalia bonotto

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  2. Plantaria a cebolinha num vaso com terra orgânica comprada naquele mercado do GAÚCHO, mandaria o FRED regá-la quando necessário e a CEBOLINHA viveria por muito tempo dando seu temperinho verde para as delícias culinárias...

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  3. Querida Alba... de cebola em cebola, eis que a vida se manifesta.
    Não sei o que pretende, mas sei o que eu faria: deixaria a cebola seguir seu rumo! Não que comer as cebolas não seja muito bom... e, de certa forma, elas existem é para isso mesmo. E não é segredo que todos nós nos alimentamos de vida. Mas neste caso, cuida da sua cebolinha... geralmente, quando permitimos vida, ela retribui de muitas formas, ainda que não intencionais.
    Beijos da Lua!

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  4. Oi Luana, gostei muito desta frase " E não é segredo que nos alimentamos de vida.." ela ficou ecoando aqui...

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  5. Ola Anonimo, esta realmente é uma bela opção..fiquei pensando em algo que achei interessante: das pessoas que conversei, nem uma sugeriu que a cebolinha permanecesse onde estava, e o destinho por melhor que fosse seria no final virar alimento..isso me fez ter a ideia de um novo conto com a própria cebola contando o seu destino triste no inicio mas exótico no
    final...aguardem..

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  6. Conto muito bem elaborado. Partindo do principio que o ambiente da geladeira propiciou o nascimento desta metamorfose ou desta nova vida hibrida , podemos concluir que o Fred é um verdadeiro propagador e guardião da vida , segundo, dada a possibilidade do nascimento de um novo ser a minha recomendação do que fazer é a criação da continuação da própria história. Esse conto poderá tornar-se um livro.

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